quinta-feira, 5 de novembro de 2015

THOMAS

Thomas olhava a boa senhora com grande atenção e inexpugnável respeito.
- Reze pr’o seu avô, mininu. E reze pr’o Gilsu também, que tá acidentado. E se quiser rezar por algum pedido seu mesmo, no particular, ou por mais alguém pode também. Só não pode rezar pra bicho ou pra coisa...
Thomas se assustou com tal desfecho improvável; e sobressaltado, cheio de sincera curiosidade, fruto das primeiras filosofias de uma mente em tenra formação, perguntou:
- E pra Deus, nhá Nira?
- Hãein, mininu?
- Pra Deus? Quem reza?
- Hãein, mininu?
- Pode rezar pra Deus, nhá Nira?
- Há! Mininu! Há! Mininu engraçado... – e a velha agregada, sorrindo e mostrando com desapego a bocarra desdentada, continuou varrendo a cozinha, saindo pela porta que dava ao amplo pátio avarandado da fazenda.
Àquela noite, Thomas ficou insone, ouvindo os grilos e os sapos dos matos da roça, pisando e repisando o assunto. Cismando muito, considerou o quão angustiante não seria tamanha pressão sobre uma mesma pessoa, e o quão trabalhoso não seria ter tantas paixões e ambições e tragédias por remediar, e o quão terrível não seria ter tantos pedidos acumulados e simultâneos e infinitos.  Não teria Ele um único instante de tranquilidade?
Profundamente comovido pelo árduo trabalho de Deus (mais difícil do que o de qualquer outra pessoa que já existiu ou que um dia existirá!), Thomas decidiu que seria somente a Deus por quem doravante rezaria.
- Meu bom Deus, que o senhor tenha uma boa noite de sono depois de mais um dia tão cansativo...