domingo, 30 de agosto de 2009

Papai


A panha do café continua morosa.Dei uma volta por lá hoje e, voltei mais desanimado ainda. Estou achando que não consigo apanhar o café todo, está secando demais e não tem nada mesmo;estou ficando muito apreensivo, estou achando que não pago as dívidas, estou querendo entregar os pontos.

Tenho pedido muito a Deus para orientar-me ,pois estou meio sem rumo, com medo da vida,não estou achando saída;minhas dívidas estão aumentando muito e as despesas cada vez maiores, francamente, estou com mêdo.Se eu vendesse ao menos o leite, daria para respirar por mais um tempo.Vidinha cacête, aqui sozinho,fazendo contas sem parar, até endoidar.E não chego a nenhum resultado esperançoso...e lembrar que fui um homem folgado, até acho graça, nunca pensei que fosse passar tanto aperto.É bom para conhecer melhor a humanidade.Amanhã irei para Lavras, não aguento mais;estou muito solitário,não é possível;não sou covarde,mas ando invejando o Zé Orlando.Não, não queria morrer,mas se pudesse dormir uns 120 dias ,devia ser bom.

E depois diz que não é covarde;covarde e dos grandes. Aguenta firme, para que foi feita a luta?Para os homens;enfrente-a galhardamente e sairá vitorioso.Não vês o ditado?"Quanto maior a luta,maior a glória"...E daí?Daí, vou dormir pois hoje não estou com vontade de lutar nada.Já são oito e meia ,da noite,aqui na fazenda, isto já é tarde demais.

Peço a Deus uma benção para minha família

Boa noite

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Sem título


Lembras
da casa
das janelas
do alpendre
Lembras
do vento
dos eucaliptos
do assovio
Lembras
do canto
das vozes
do amor
Lembras
do Caetano
dos Zés
do Bento
Lembras
do sol
das manhãs
da alegria
Lembras
lembras
tenho medo
de não lembrar

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Alguns Versinhos

Fatal

Fazenda da Guanabara, 27 de agosto de 2009.

Fatal:
Idade pouca,
Vida louca.
Idade avançada,
Vida pacificada.
...

Por bem ou por mal.


Declaração

Fazenda da Guanabara, 19 de janeiro de 2006.

Fique comigo,
Umidecerei seus lábios
Com vinho e orvalho
E me deliciarei.
Fique comigo,
Serei seu pai, seu amante, seu amigo...
A tornarei líquida
E a sorverei.
Fique comigo,
Sem reservas ou ressalvas,
Desminliguida,
Como uma largata ao sol,
Se desmanchando...
Ah, amor... Fique comigo
E a comerei
Com paixão e amor...

E a comerei
Como Deus come uma fruta;
Como o Diabo come uma puta.


SUICIDA

Fazenda Guanabara, Ago/2006
Eu hoje acordei tresloucado,
subi em direção ao cume do telhado
e lá, nu, os braços em cruz,
expus
e me livrei de todos meus fardos.

“Despirocou, Despirocou, Despirocou...”

Gritam lá de baixo as pessoas estabelecidas,
talvez acreditando ser eu um suicida,
mas não, não sou, não sei...
Talvez o seja.

Não por atentar contra a própria vida,
mas contra o viver que até então me dei.

No quarto úmido e ermo,
ficou meu corpo, desgastado e enfermo,
todos os meus erros,
os ternos, as camisas, as gravatas,
as meias de seda, os sapatos de verniz,
as chaves do carro, as bravatas,
as conquistas baratas,
os poemas que não fiz,
o livro que não escrevi,
a armadura,
- arma dura ? –
a espada...
Saí.

“Despirocou, Despirocou, Despirocou...”

Ainda ouço as vozes dos estabelecidos,
- distantes, cada vez mais distantes. -
E me jogo no vazio, para ser esquecido
e esquecer.
Rumo ao sol radiante,
onde meu corpo será incenerado
para que eu (meu eu) possa finalmente viver.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

O PORTAL

Tirei o telefone do gancho. Fitei os números pausadamente. O impulso que me levara até ali tinha um quê de misterioso, de sobrenatural. Afinal, seria possível alguma resposta? Algum interlocutor? Mas por que, então, a insistência? Por que agora a repetição desses dígitos tão familiares?

Em minha primeira tentativa sequer passei do 0. O indicador subitamente estancou, pairando no ar, inseguro, trêmulo. Senti que, ao finalmente pressionar a tecla 6, um portal me seria aberto, uma passagem a décadas extintas irromperia daquele tom, um tempo estritamente irmanado com o presente em luto se ergueria do passado e se apresentaria aos meus ouvidos. Senti que o som da campainha, reverberando pelos espaços vazios da casa, poderia ser escutado por alguém que lá já não estava, mas que, por haver estado outrora, pudesse me atender de sua margem da existência, de sua freqüência a mim ininteligível.

Sim! Um portal!

Fiquei maravilhado com pensamento tão abstrato e os dedos afoitos, nesse delírio de febre, voltaram-se novamente ao processo. Dessa vez, porém, com impávida segurança. E o 0, com seu jeitão de operador telefônico, foi enfim pressionado com vigor e vontade. Mas novamente sobressaltou-me o receio pelo desconhecido, um arrepio gélido me açoitou a espinha, interrompendo a espera, arremessando o telefone de volta ao gancho.

Mas e o portal recém-descoberto? Que se faria dele?

Depois de alguns minutos de um transe perplexo, em que meus olhos se arregalaram e em que meus pensamentos se estranharam com violência, voltei ao bendito telefone. E dessa vez, no afã de desmitificar a ilusão criada, de assenhorar-me da razão destituída, fui enfático e determinado. Executei todos os números pausadamente, seguro do meu gesto, e com o semblante tomado de apreensiva excitação deixei com que o tempo agisse por conta e com que o som se manifestasse através do espaço.

O telefone tocou, tocou, tocou e tocou. Uma lágrima me escorreu, escorreu, escorreu e escorreu. Não havia portal. Não havia ninguém.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

D.Lilia

Maria luta e alegria
Conceição amor e dedicação
Mulher primeira
Mulher pioneira

Lilia do movimento da igreja
Lilia do tio Milton
Mulher guerreira
Mulher fazendeira

Lilia da Health Glo
Lilia do salão
Mulher empresária
Mulher necessária

Maria boa mãe
Conceição ardência e tesão
Mulher birrenta
Mulher ciumenta

Lilia de várias crias
Lilia religiosa
Mulher de Maria
Mulher que meu pai carecia



Queridos irmãos e afins,escrevi esta singela homenagen a nossa saudosa matriarca(palavra estranha esta).Para minha felicidade ela chegou a ler, e comentou:"Nossa, ele contou minha vida!"

Beijos



PS-Este irmãos e afins,aprendi lendo sobre familias de aves.Ex. tico-ticos e afins.

domingo, 16 de agosto de 2009

Tempo bom

Dizem que, quando os soldados estavam no encalço de Jesus;os passarinhos tiveram participação:
O bentivi gritava esbaforido
_Bem que te vi,bem que te vi
O joão de barro em dueto com a companheira dizia
_É amentira,é mentira,é mentira
As rolinhas fogo-apagou iam apressadas andando e ciscando as pegadas de Jesus afim de apagá las e assim despitar os soldados.
Por isto nós quando moleques não podiamos matar a estilingadas rolinhas e joão de barro.


Estas são estórias que nos eram contadas pelas pretas e pretos dos Paulo Freitas,para que não trucidacemos alguns passarinhos

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Era mulher

Como as mulheres desta família, estão muito silenciosas, resolvi provocá-las com o começo de mais uma estória:

"Era mulher.E isso era tudo que possuía.Sabia-se mulher.Os longos dedos sapateando no teclado denunciavam essa feminilidade tímida, ritmada.Era mulher e os fios de cabelos escorrendo pela face completavam: é mulher não enxerga bem.Sabia-se mulher.Que o diga o roupão aberto oferecendo os seios.
Ali estava ela diante da tela buscando a palavra exata,mas era mulher e a língua passeando entre os dentes,pressionando o escorregadio da alvura ironizava a precisão insensata da palavra exata.
A língua, os dentes... os dentes, muralha para palavras opalas,deixavam que a língua por eles deslizasse desenhando contatos lascivos,profanando reentrâncias ásperas...
-Clarice!...Clarice! Terminou?
Não.Não terminara.Terminou o quê?Era mulher, essa coisa vaga que não se finda,que depois do ponto há um pouco ainda.
-Clarice!..Clarice!Não está me ouvindo?
Sim,ouço.Ouço essa voz que me interrompe, que me incomoda, que me estorva.Mas sou mulher e aprendi a criar o silêncio, a me fechar em copas e ignorar a resposta.
-Clarice!...Clarice!Meu amor,o tempo ruge!
Ruge o tempo.Estanca o próximo passo, perde-se o compasso, chama o cansaço, adormeço nos seus braços?Era mulher, esperaria o desabafo.
-Clarice!...Clarice!...Não se faça de tola?
Ah!não me peça isso!Como decifrá-lo não me fazendo de tola?Era mulher e assim aprendera a fingir aí estar quando não estava nem aí, a conversar quando nem enfrentara o monólogo, a aturar até mesmo quando o corpo eriça feito felina.
.................................................................................................
Cessou.Nem mais um chamado.
Ali estava ela diante da tela buscando a palavra exata.Como encontrá-la?Palavra exata para idéia barata.Barata..Samsom transformara-se em barata,mas ela não lera Kafka.Coisa asquerosa...e o torvo pensa em mim.Plágio?Era mulher e ui, como sabia plagiar: metamorfose de areia em águas .No plural.As águas expandem, escorrem, derramam,moldam...águas molham,ensopam.Era mulher,essa coisa úmida, molhada,encharcada.Águas, gotículas bem disfarçadas em unidade.Coisa mais feminina.
A palavra exata é água. Águas em cascatas ,águas em música.
-Clarice!...Clarice!...Vem dormir?
Justo agora?Tenha pena!Encontrei a palavra exata.Era águas.Assim no plural,em discordância. E isso era tudo que possuía.Era mulher e agora também águas.
-Clarice!...Clarice!...Vem dormir!
Não já.Acabara de acordar para quem ela era.Dormir? Não agora.Morrer poderia.E vomitar uma estrela de cinco pontas aguadas.Mas essa era outra Clarice.
-Clarice!...Clarice!...Terminou?Sim, terminara.Garimpando a palavra,completara a idéia.Não, não era barata

Bené


Aí está mais uma estorinha...é claro que vocês a conhecem,porém essa é a minha criação dos fatos...liberdades, supostamente literária.
"Maria sentiu-se aliviada, o ar chegava-lhe aos pulmões. E os pensamentos voltavam-lhe à mente. Escutou o azulão cantando na cozinha, estranho pássaro que canta noite adentro.Seria um presságio?Ou,quem sabe,seria apenas música etérea?Gorjeios... Seria ela levada por uma sinfonia de... Sinfonia de pardais anunciando o amanhecer...
-Tem alvorada, tem passarada, alvorecer...E o morro inteiro ao fim do dia reza uma prece ave-maria - cantava docemente a mãe, enquanto abria as enormes janelas da casa da fazenda, deixando entrar o cheiro gostoso do eucalipto, os sons dos animais, as vozes das empregadas e da criançada, já na horta.Suas mãos delicadas agilizavam o dia e prometiam para a dureza deste um pouco de poesia.
- Mãe, olha a manga que apanhei pra senhora. Estava lá na pontinha do galho.Apanhei sem deixar cair – gritou afogueado Benedito.
- Que beleza, filho, vou chupá-la escondidinha – brincou a mãe.
Benedito era o irmão do meio, a euforia da casa. Menino forte, expedito (gostava da palavra pelo trocadilho), levado da breca, sedutor...De todos conseguia perdão. Tinha um jeito tão manhoso de se fazer perdoado que a gente da casa ia assim, perdoando, sem saber que o fazia. Adorava a mãe e era para ela que trazia a manga mais gostosa, a flor mais cheirosa, o agrado mais delicado. A mãe era, para ele, uma espécie de guardiã. Quando Benedito caprichava na bagunça e o pai colérico queria lhe arrancar o couro, era mãe que, afobada, desviava o encontro fatídico entre pai e filho.
- Bené, que horas você vai estudar para prova ? - perguntou a mãe preocupada e já sabendo que uma desculpa espirituosa sairia daquele riso matreiro
- Depois, depois mãezinha. Hoje estou atarefado.Pai me mandô ir na estação trazê açúcar.Sou, nessa casa, pau pra toda obra. Não vê minha batata. Sou Tarzan, só falta a Chita –brincou -A senhora quer alguma coisa? Pega o embornal para mim, mãe. Pai já tá dando aquele assobio de arrepiá os cabelo - sussurrou o menino.
-Olha como fala ,menino. Olha que falta faz o estudo -repreendeu a mãe.
- Não vai fazê pra mim. Vou ficá rico, vou ser fazendeirão que nem Custódio. Metido, vou ser. De cavalo bom, camionete Tesoto e curral cheio, tudo gado holandês.
- Seu avô tinha tudo isso – lamentou a mãe e pôs um olhar tão saudoso para o lado do curral que fez o coração de Bené apertar.
- Seu filho vai ter tudo isso e você mãezinha vai ficar importante, tão importante como Vó Chichica, cheia de nove horas.
- Não implica com sua avó – censurou.
- É sua mãe, é verdade, mas não é à toa que Maria chama ela de vovó pimenta – retrucou Bené já correndo para o porão de arreio.
- Olha o português -corrigiu a mãe - Maria...Essa menina está voluntariosa que só... E seu pai dá muita trela...resmungou.
Bené já não mais ouvia. Montado no cavalo, cheio de pose, lá ia galopando rumo à estação de trem. Maria o viu de longe. Admirava o indômito irmão, a abarbarada criatura. Nada conseguia detê-lo, também ela ambicionava aquela agilidade, a alegria valente de quem se deixa levar pela vida...
Mas ...Bené demorou na venda da estação. O dia findando e, o moçoilo não voltava. Pai e mãe olhavam aflitos a estrada...Nem sombra do cavalo e seu cavaleiro errante; a criançada pelos cantos confabulava imaginando onde se metera Bené. Alguma ele estava aprontando, não havia dúvida. O primogênito, na responsabilidade que lhe conferia a posição, já se preparava para sair em busca do menino capeta, quando se ouviu um corre-corre, um Deus nos acuda, um Virge Maria valei-me, na cozinha.
- Nossa Senhora, Bené se pegou com o filho da Rola no corguinho de baixo, deu uma surra no coitado que ele ficou lá, estirado na água. Dorgino quer matar Bené, diz que fio de patrão nenhum faz isso com fio dele -falava apressadamente Maria Caetana às outras empregadas.
- São Benedito, nos acuda! E o mantimento que vinha da venda? - perguntou Divina não aguentando de curiosidade.- Bené, ah menino danado!
- O saco de açúcar caiu no corgo...Hoje peixe vai comer doce -riu gostoso a cozinheira.
- Corre Divina, cerca Bené! Manda-o vir pelo portão da horta que o pai está bufando no alpendre. Vai acabar com ele –alardeava a mãe, já se colocando na defensiva.
Porém, antes que a empregada tomasse qualquer iniciativa, a mãe desceu as escadas em disparada ao encontro do filho, mas ao vê-lo molhado, rasgado, segurando o saco de açúcar vazio, o olho roxo e aquele risinho safado:
- Não disse, mãe, que comigo ninguém pode. Moí o valentão - falou entre dentes Bené.
- Ninguém pode, não é Benedito? –gritou mãe e foi ligeira, tremendo, tirando o chinelo do pé que dançou bonito, ritmado na bunda do menino.
- Ai! Ai! Ai!-pulava Bené na cadência da batida.
Da varanda, as empregadas viam o pandepá, a pândega, o pandemônio...Tonho varrendo o terreiro, segurava o riso. Divina, doutora em Bené,sussurrou ao pé do ouvido de Maria Caetana:
- Garanto que comadi Rola tá no meio. Querdita que o capeta tá fingindo que dói. Chinelo de pano...-tampou a boca para a risada não escapar.
Bené esperou a mãe se acalmar e saiu de fininho, de cabeça baixa; muito sentido até sumir de vista da raiva materna. Depois, soltou larga a sua risada...Estava meio estropiado, pois sim; mas deu uma lição no outro e além, a Rola valia a pena...Mulata cheia de curvas e reentrâncias...Era mulher de Dorgino, mãe do mulatinho metido a invocado, mas, engraçara-se pro lado dele e as reentrâncias pediam um homem de conhecimento e esse, pois não; era ele. A coisa ia ficar feia. O chinelo de pano da mãe amaciara as nádegas para a correia do pai. Dorgino jurara não respeitar o fio do patrão e da novena ele não sabia a metade.Ah Rola, Rolinha do meu coração.
Sempre em busca das últimas, a noticiosa Francisca veio vindo em auxílio do irmão:
- Bené, pai está andando de um lado para o outro, só esperando você cansar de se esconder. Dorgino já veio falar com pai e pediu as contas, mas te jurou de morte. Só ouvi pai dizendo que nessas terras não tem assassino e que todo corno que se preze vai esconder sua vergonha em outras paragens.
- Me lasquei Esse camarada faz falta.Como pai sabia do achego? – ajuizou - Nem Dorgino sabia, só o filho dele.Desgraçado, viu o que não era pro seu bico. Rola vai se embora?
-Tem vergonha, não? Olha a confusão. Divina, com ciúme, acabou dando com a língua nos dentes. Vem, vamos entrar. Mãe está se remoendo de remorso. Está apavorada com essa história toda.Você diz pro pai que não foi culpa sua, que Rola é assanhada, coisas de homem...Vocês se entendem.
Devagarzinho, tímida, amedrontada, Maria foi se aproximando.Também ela queria se fazer necessária, também ela queria mostrar sua preocupação com Bené. E mal tocou no ombro de Francisca, e já os dois em uníssono gritaram:
- Vai embora daqui, Repórter Esso. Já contou pro pai, não é sua linguaruda?
Maria ia responder, quando ouviu o som da correia deslizando entre os prendedores, virou e viu a figura enorme do pai que vinha em passos largos para cima de Bené.
-Não pai, não...-murmurou o menino
-Pai, não é culpa dele, foi a Rola...-gemia Francisca.
-Desapareçam, meninas!...Isso não é coisa para vocês.
As duas apavoradas, saíram correndo.Mortificadas, ouviram as correiadas estalando no corpo rijo de Bené. O menino não chorava, nem um gemido soltava...Orgulhoso esse filho de meu pai. Maria ainda o olhou uma vez mais.Ajoelhado, encolhido em si mesmo, recebia o couro paterno, mas Maria viu seus olhos encarnados e esses prometiam vingança:
-Francisca, acredite, não fui eu que contei pro pai onde estava o Bené. Apenas adivinhei e papai me seguiu-explicou a menina
-Retardada, nunca pensa antes de agir. Você me paga Maria! Coitado do Bené, pai vai esfolar o lombo dele. Você me paga...-grunhia a irmã.
Humilhada, Maria se afastou. Era uma desastrada. Não queria aquela violência. Pai sabia ser bravo, enérgico, quando era preciso. E ademais, Bené era impossível. Parecia que o irmão gostava de provocar pai, sempre o desafiando, medindo forças. E agora o camarada Dorgino ia embora.Ia fazer falta, meu Deus!Coitado do pai, coitado do Bené...Coitadinha de mim..."

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

A vida tá ficando muito chata


De repente – Aliás, nem tão de repente assim! – o Estado decidiu que somos todos inaptos física e mentalmente para governar nossas vidas e resolveu nos tutelar como se todos tivéssemos sido vítimas de súbita e aviltante regressão, a qual nos conduziu à tenra idade de um bebê mal começando a engatinhar e que requer toda atenção e cuidados pra que não se estrepe.

Pior: Talvez inspirada no atrevimento governamental, a sociedade também resolveu tutelar o individuo, parindo, aos montes, os politicamente corretos, os eco-chatos, os ratos-de-academia, os ultra-hiper-vigilantes-do-peso, os amigos do coração, do fígado, dos rins, dos intestinos, da próstata e, quiçá, do ânus... Para cada célula humana, desde a primeira papila gustativa da pontinha da língua, até a última ruga do cê-sabe-do-que-tô-falando (será que, com a nova reforma ortográfica, todos esses hífens seriam admitidos?) existe um chato, uma ONG, quiçá uma OSCIP, a se preocupar com o seu (da célula humana) bem estar.
E a vida foi se ficando chata, chata, chata... Cada vez mais chata.

Antes – pelo menos no meu tempo – o rebu seria armado se um baseadinho fosse apertado e aceso, hoje o bicho tá é pegando para um inofensivo caretinha, um Hollywood qualquer da vida...

O governo restringiu, a sociedade digeriu e o pobre fumante foi, progressivamente, transmutado de elegante, charmoso e poderoso (Like Clark Gable) para indiferenciado, inconveniente, discriminado e... Pasmem, criminoso! (Laique Comedor de Criancinhas). Exagero? Exagero nenhum. Agora qualquer um, ainda que esteja a quilômetros de distância de um fumista, se sente no direito de se auto promover a “fumante passivo”.

Podes crer, amiguinhos: Trata-se sim de promoção, de elevação de status!

Vira e mexe ocorre um ferrenho embate (Um duelo; Tema: "O dólar Furado" ou "O bom, o mau e o feio"): Fumante Passivo versus Pacato Fumante e, usualmente, o Fumante Passivo sai vitorioso, porque, via de regra, Fumante Pacato tem mais educação e comedimento.

Fumante Passivo, que bonito!

- Kct, deixem-me alimentar meu futuro câncerzinho em paz!

E tá lá o Senhor Fumante Passivo, empertigado, poderoso, cheio de empáfia:

- Garçom! Aquele parvo está com explicitas intenções de me assassinar... Aguardo enérgicas providências.

Um parêntesis: Não sou fumante discursando em causa própria.

Mas não é só isso... Não. A amolação vai muito além!

Experimente saborear uma picanha com uma bela capa de gordura (que seja um dedinho apenas), um chouriço (aquele de sangue de porco e tripa do intestino grosso – do porco, é claro!), um inocente torresminho... Tá bom, peguei pesado. Mas que tal uma suculenta “macarronada da Mama”?

Não tenham dúvidas. Como se em permanente guarda, surge, prontamente e do nada, o batalhão dos defensores da saúde alheia.

- Hã...hã! Tá boa essa carninha, né? Seu coração agradece...

Haja paciência! Minha alma, infinitamente mais sincera, agradece muito mais, pombas!

E os ratos-de-academia? Arrasam, com um olhar pra lá de maligno, qual o do Vampiro Brasileiro de Chico Anísio, com aquele que optou por sentar placidamente num banco da praça e tomar seu chopinho enquanto lê no jornal as notícias de seu time do coração.

- Sedentário! – Exclamam com desdém, ao passarem correndo... O sovaco despejando bicas de suor.

Haja saco! Quem tem que correr é o centro-avante de meu time, pombas (de novo)! E, uma vez mais, como faz bem para meu espírito, ficar aqui, sentadinho, sob um lindo sol de domingo, observando apenas as flores e os passarinhos (liricamente)!

“! Si hay gobierno, soy contra!” – Dizem sabiamente os espanhóis... Entendendo por “gobierno” qualquer tipo de mando, velado ou explícito, estou com os “hermanos españoles”. Por convicção de infância, sou frontalmente contra a qualquer forma de autoritarismo: Governamental, paternal, matrimonial, filial, social e etc e tal...

Mas, sinceramente, reconheço o direito de todos “os hifados” acima. Eles que busquem sua turma, se reúnam em frente a uma salada de rúcula orgânica, acompanhada de suco de graviola e, como sobremesa, açaí com guaraná, enquanto discursam sobre o tema politicamente-correto-do-dia... Que maravilha!

Eita vidinha que ta ficando cada vez mais besta, sô!

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O Peido

Esse blog tem andado muito intelectual!

Pudera! Tendo como autores pessoas do calibre de minha irmã Cocada, de meu irmão Tarlei e de meu sobrinho Thiago (Rose e Dado não listo, porque ainda não publicaram) que eu poderia esperar?

Mas só para quebrar o clima, resolvi esculhambar com estes versos um tanto, digamos, inusitados.


O PEIDO

Fazenda da Guanabara, 11 de outubro de 2005.

Ninguem educado faz.
Mas que é bom é... E faz feliz.
Tirar uma meleca encravada no nariz.
Vem bem, muito bem, lá de traz.
Um arrepio folgado na nuca, gostoso,
- É quase um gozo -
E uma vontade louca,
Mais do que de mais, de espirrar...

E arrotar? Uma das melhores grosserias.
Depois de uma, duas, três... cervejas
Em qualquer mesa, ninguém quer que seja,
Deveria se privar de tal alegria
E um arroto conter.

Existe coisa mais boa?
Há quem diga que não, há quem diga que sim.
Eu aqui, sossegado e atoa,
Digo, sem pretender dar à polêmica um fim,
Que o bom, que o melhor mesmo, é peidar.

Peido contido, assoviado e fino,
Que vaza, avexado, assim meio sem querer.
Esse fede mais do que o destino,
E faz qualquer um se arrepender.

Peido amarrado, sem graça e chocho,
Esse não causa impacto , é quase só ar,
Como aquele que soltou o bom moço
Que, coitado, até pensava em se casar.

Mas peido bom, peido de fato, sensacional!
É o liberado das tripas sem nenhuma contrição.
Sonoro. Preciso... Não, esse não cheira mal.
Mas é uma porqueira danada, uma beleza de explosão.

Ninguém ensina isso para um filho,
E faz muito bem, que educação vem mesmo do berço,
Mas o fato é que a vida sem deslizes não tem brilho,
E tem se tornado, sob tutela, cada vez mais chata,
Reserve, então, uma parte da sua, pelo menos um terço,
Para fazer tudo aquilo que não se deve propalar.
Incluindo, é claro, peidar!

Um dia de Fúria

O temperamento indócil, o ritmo frenético, a gana por atingir seus objetivos em curtíssimo espaço de tempo e a incômoda e persistente falta de dinheiro, fizeram de nosso pai um homem de humor extremamente instável, oscilando, no milésimo de segundo da explosão de um flash, entre o de um pacato bichano a ronronar inofensivo ao do de um assustador leão a rugir enfurecido. Houvesse um psicólogo por perto e seria dito tratar-se de um comportamento bi-polar... Bobagem! Papai era na verdade um homem de “estopim curto”, muito curto...

Esse caráter explosivo foi o motor de vários súbitos surtos de fúria que, tão logo debelados, se transformavam em motivos para profundo arrependimento ou para boas risadas, dependendo de como o pós-surto fosse tratado por Dona Lilia.

Lembro-me de alguns deles: A batalha do trem; Passarinho, o retireiro bêbado; O leite derramado (que não se trata do livro de Chico Buarque); Confronto na roleta da estação... São alguns que me ocorrem agora.

Pretendo registrar neste blog aqueles dos quais me recordo bem, usando o máximo da memória e um pouco da imaginação quando necessário.

Se alguém se lembrar de mais detalhes dos que publico ou mesmo de outros, por favor, me corrijam ou publiquem os seus.

A banda de porco

Como era comum, papai tinha com Dorgino um capadinho criado “a meia”. Para os não tão caipiras, explico: Capadinho é um leitão castrado levado à ceva para recria e engorda e posterior abate; e “a meia” é uma forma de repartir custos e resultados em um empreendimento qualquer que, no caso, consistiu de ter nosso pai fornecido o leitão capado - cria de seu mangueiro - cabendo ao Dorgino, empregado na fazenda, arcar com os custos da recria e engorda.

A bem da verdade, essa modalidade de negócio interessava mais ao meeiro que trataria da recria e engorda e, por isso mesmo, papai sempre reivindicava para si algumas prerrogativas como, por exemplo, decidir pelo dia do abate segundo sua (leia-se de Dona Lilia) conveniência.

Passado algum tempo e tendo o bicho já dado fim em umas tantas quartas de milho, outras quantas de fubá e muita abóbora madura, de tão gordo que estava mal andava e Dorgino, lambendo os beiços só em pensar nas suculentas suãs que derivariam do suino, vinha humildemente insinuando para nosso pai que estava já passando da hora de fazer o torresmo, com o que papai até concordava.

Ocorre que Sá Eurides (Eurídice?) encontrava-se adoentada – espinhela caída – e mamãe, nem que a vaca tossisse, se arriscaria na empreitada de preparar o porco, ainda que fosse apenas uma banda (de novo, para os menos caipiras: Uma banda é a metade do porco que cabia a cada meeiro), sem a ajuda dela, por isso papai vinha sistematicamente postergando o abate.

Num domingo, por volta das dez horas da manhã, estávamos todos no alpendre, quando papai avistou o Dorgino, ainda lá do outro lado do corguinho, vindo na direção da sede... No ombro, a banda de porco pendurada.

- Aquele merda matou o porco! – Exclamou ele, surpreendido com tamanha ousadia e antecipando o que ouviria de reclamações, partiu chispado, cospindo fogo, ao encontro do camarada.

Julho, tempo seco, estrada poeirenta... O embate se deu ainda do outro lado do corguinho, logo após a primeira curva, em seguida a casa do Passarinho. Do alto de uma paineira que margeava a estrada, da porta de sua casa, apenas um joão-de-barro, acompanhou atônito o desenrolar do evento: A poeira subiu, a banda de porco desprendeu-se do ombro de um apavorado colono, indo parar no pasto ressequido, Dorgino, cara suja de pó, fez meia-volta e se mandou ligeiro, após o safanão, felizmente sem ser perseguido por papai... Mais não foi visto e tão-pouco ouvido. Não pelo joão-de-barro que agora já se ocupava novamente com sua casa.

Papai veio bufando... Assim que a porteira do eucalipto bateu e antes que o tempo esquentasse também para nosso lado, tratamos de escafeder-nos rumo ao pomar e quando os passos duros de papai ecoaram no assoalho de tábua corrida da sala, o último de nós já havia vazado pela porta da cozinha.

- Lilia... Lilia! – Gritava ele em busca de mamãe que, nessa altura dos acontecimentos, tinha se trancado no banheiro.

Do desfecho da história, sinceramente, não me lembro.

Como o porco não poderia ser reconstituído e tão-pouco ser ressuscitado, não sei se a banda voadora acabou sendo trazida para nossa casa, se o Dorgino ficou com as duas partes ou se a que foi parar no mato acabou por virar comida para os urubus... Sei que Dorgino continuou trabalhando normalmente na fazenda, ainda por muitos anos e que outros capadinhos foram dados à meia ao próprio Dorgino e a outros empregados de papai, sem que novos incidentes de maior gravidade ocorressem.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Canção

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
-depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito:
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

Cecília Meireles

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Enfim o correspondente de Goiás

Finalmente o maninho Tarlei aceitou meu convite e aqui está na qualidade de correspondente de Os Ferreira, no Estado de Goiás.
Bem-vindo!
Agora é só nos brindar (com grande frequencia, espero) com seus belos versos, textos, notas, notícias...

domingo, 2 de agosto de 2009

Saudades

Minha querida irmã,sou um felizardo por poder participar deste blogger,descobri num rascunho uma preciosidade(Benedito e Maria)

Beijo

Tarlei



Saudades


sal da idade
prazer
de quem não tem prazer
olhos marejados
mortiços
vendo o passado
jovem e alegre
não compreendendo
a solidão presente
a força ausente


Vejo tempos idos
com clareza
como vê seu algoz
um ferido
parece que a fumaça
a neblina
me embaralha
a mente
não consigo pensar
só lembrar