terça-feira, 9 de julho de 2013

Abismo II



Frágil. Sustentando-se há tanto, a vidraça estilhaçou.

Contorcendo-se de dor no estômago vomitou sangue

Sobre a serpente enrrodilhada junto aos seus pés. O bote é iminente.

O ribombar do trovão ecoou também em suas vísceras amorfas,

Inutilizando-as ainda mais. Um soco formidável num feto sem vida

Que o prostou de joelhos, com a cara esboroada entre as mãos.

 

Ora, ora... O vulto que se aproxima não lhe mete mêdo,

Apenas o odor que exala – terra bolorenta e velas apagadas –

Causa-lhe certo asco. E as mariposas fosforecentes que o circundam,

O desconforto de saber-se em pouco roído por malditas larvas.

No mais, alívio... A poucos passos está o alento definitivo

E, finalmente, o desfecho exato para séculos de solidão.

 

Não há mais o que temer. Nenhum risco na serpente aos seus pés.

O abismo o traga, mas a bruma é leve e surpreendentemente doce.

Súbita calma organiza e cataloga, uma gaveta para cada mistério,

Todos os seus dias, fragmentando sua existência até que nada mais reste.

Agora é só cerrar as janelas e lentamente deixar a paisagem desvanecer.

Sorver o ar num último trago e entregar-se, contrito, à imensidão.
 
 
***

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário