quarta-feira, 15 de setembro de 2010

"À Clarice ou aos tristonhos sem quimeras"

Assistindo a uma entrevista de Clarice Lispector, escrevi:

Hoje eu morri, talvez amanhã renasça, mas hoje eu morri. Falo: eu morri. Estou cansada. de viver essa existência do sonho. Há um vazio estrangeiro, sou toda uma dor não sentida, dor de morte. Hoje eu morri, repito. Venho morrendo pela vida afora,venho ficando assim solitária e cansada, mas não tenho vontade de ter companhia. As pessoas não me interessam, o interesse estava no que não eram, sabendo-as, não me interessam. Não me sabendo, sufoco. Hoje eu morri, morri de tanto saber o que não sei.Não há mais esperança, estou cansada... mas, talvez amanhã renasça e talvez até saiba que o que não sei é tão pouco, há muito mais o que não saber.Mas hoje eu morri e tudo está distante,impalpável...o morto não tem tato; e tudo está tão longe, inaudível...silenciou o que antes era música. Trago o olhar duro porque os olhos não me fecharam .Esse olhar de quem não sabe, esse olhar de cansaço, de solidão...mas o morto é mesmo solitário. E quando dele querem notícias perguntam aos outros, o morto não tem o que dizer, está morto. E assim, um dia, quem sabe, me fecharão os olhos para que não veja que a minha morte comove tão pouco, que essa ausência não faz falta. Hoje eu morri, e deixo, antes do estertor derradeiro, o silêncio dos que não precisam de consolo. O passado é uma roupa que não me veste mais. Entorna em mim o que é inexistência.

2 comentários:

  1. O que a Clarice disse em sua entrevista para lhe inspirar a produzir esse maravilhoso texto?

    Confesso que fiquei curioso...

    Beijo.

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  2. Matando a curiosidade, vai o link da primeira parte da entrevista, tio. As demais estão na sequência.

    http://www.youtube.com/watch?v=9ad7b6kqyok

    Beijo.

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