quinta-feira, 2 de julho de 2009

Causos de Milton Ferreira (O campo de aviação)

Já comentei, num outro post, acerca da sanha empreendedora de nosso pai, a qual acabou por transformar, em certas ocasiões, a nossa querida Fazenda dos Coelhos num verdadeiro canteiro de obras... Tal fato, além disto, nos propiciou passagens divertidas, como em mais esse “causo de Milton Ferreira”:

Construída a fábrica de queijos, seguramente a mais moderna da região, e não tendo nosso pai nenhuma experiência na produção dos derivados de leite e menos ainda na sua comercialização, decidiu ele a arrendar para o Sr. Hanz Noremose, um senhor de origem holandesa, radicado em Minduri – MG, onde se tornou um dos mais respeitados produtores de derivados do leite, sob a nacionalmente conhecida marca dos laticínios Danna.

Ocorre que o Sr. Hanz possuía um aviãozinho mono-motor (teco-teco) do qual fazia uso para seus deslocamentos até as suas fábricas espalhadas no sul de Minas Gerais, e nosso pai – não sei se a pedido do Sr. Hanz, ou não – prontamente tratou de preparar, bem no alto do “pasto de cima”, um campo de aviação para os pousos e decolagens da máquina voadora do holandês.

E finalmente chegou o dia da primeira visita do Sr. Hanz Noremose em sua mais nova instalação para produção de laticínios.

Já no dia que antecedeu à sua chegada, a expectativa era grande, e os últimos preparativos foram providenciados a toque de caixa: Mamãe cozeu um enorme coador de café, que, segundo instruções de papai, faria, após pendurado no comprido bambu, a função de uma biruta; Papai inspecionou mais uma vez a pista e fazendo uso de sua quase inseparável foice, deu os últimos retoques no campo, podando um ou dois arbustos mais atrevidos, algumas moitas de juá ou de assa-peixe; E, Passarinho, devidamente orientado, demarcou o meio do campo, com um enorme círculo desenhado com cal...

A expectativa era de que o “pássaro mecânico” surgisse no horizonte por volta das dez horas da manhã.

Assim, por volta das nove horas – provavelmente até mesmo antes disso – estávamos todos a postos, a espera do heróico pouso do teco-teco. Papai, mamãe, alguns empregados, filhos (não me lembro quais empregados e nem quais os filhos, sei que eu estava lá, para testemunhar o acontecido)...

Céu muito azul, quase sem vento... A biruta murcha, pendida ao longo da haste de bambu, em razão do peso excessivo do tecido e principalmente porque uma biruta definitivamente não é um coador grande, e em que pesasse o esforço de papai em fazê-la cumprir seu papel, através de insistentes chacoalhadas no bambu, nada indicava, assim como nenhum avião manchava o azul do céu...

As horas passavam... As crianças já um tanto desinteressadas do evento, se entretínham com outros folguedos, papai e mamãe firmes, os empregados meio sem jeito, cabisbaixos e... Mas eis que surge o esperado!

Uma agitação! Lenços e mãos são abanados, assovios, sacudidelas na biruta broxa... E o aviãozinho, insensível, passa por sob nossas cabeças, faz a volta na altura da fábrica, cerca de um quilômetro dali, uma, duas, três vezes e desaparece no horizonte.

Algum tempo depois chega o um Sr. Hanz, vermelho, afogueado pelo sol e suando mais do que o cavalo no qual vinha montado e que tomara emprestado do João Lopes...

O pouso foi realizado num campo de futebol , mínimo, talvez um terço do que papai preparou, que ficava próximo a venda do dito João Lopes, na Estação de Paulo Freitas, a cerca de seis quilômetros de nossa sede.

Claro que nosso pai não se deu por vencido.

Tempos depois, com os devidos ajustes e sem a biruta impotente, o campo de aviação do Seu Milton passou a ser usado regularmente, quando das visitas do Sr. Hanz a sua fábrica.

Um comentário:

  1. Não posso ler esses causos no trabalho, gente. Estou deveras emocionado... Com licença. Thiago.

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